Escrevo com caneta de tinta permanente marca Sheaffer, aparo de ouro, em papel de 80 gramas. Tal como cantava o antigo samba, “tenho uma irmã que se chama Ana” que nas suas inspiradas horas vagas transfere tudo para o computador, de preferência em caracteres arial, corpo 12 a espaço e meio. É sobre essa mancha a princípio estranha, que vou exercer a minha crítica interveniente que pode dar para demolir tudo e refazer ao sabor do momento. Se for longo, o novo texto salta para o bico da Sheaffer e assim sucessivamente. A verdade é que, apesar da minha aversão às teclas, que vem talvez do tempo das máquinas de escrever nas quais erros e correcções se sobrepunham á ideia e sobretudo ao prazer da escrita, e das tentativas falhadas de fazer corresponder os sons que despertava nas teclas do piano aos que ia descobrindo algures nos neurónios inacessíveis, acabei por me render à clareza das manchas que, apesar do conflito com as teclas, vou manobrando e orientando no sentido das paragens nunca localizadas da memória ou do desejo. O conflito situa-se agora, mais raivosamente, ao nível dos telemóveis, sobretudo quando por delicadeza me sinto obrigado a enviar um SMS.

Então e o “blog”?

O blog veio ao meu encontro. Apareceu feito por traição da minha própria filha Ana (são três as minhas Anas mais próximas: mulher, filha e irmã) e não sei como serão as nossas futuras relações. Com o blog, evidentemente. Logo se verà. Mas o verdadeiro responsável foi na verdade O DIA CLARO.

terça-feira, 12 de julho de 2011

O Dia Claro



O DIA CLARO foi crescendo e anunciando-se ao longo de cinco anos. Começou por ser apenas um certo mal-estar como tantos outros, os que vão aparecendo e desaparecendo, às vezes sem causa definida e os que vão ficando e chamando sobre si a nossa atenção. 
Esse mal-estar não me dizia respeito. Tinha a ver com os outros. Com vocês, para quem quiser enfiar a carapuça, e consistia no reconhecimento de uma certa tendência bastante generalizada para perder o sentido da individualidade e deixar-se afundar numa massa de gente, em torno de uma bola, uma cruz, uma estrela da TV. E no entanto, o facto de termos chegado em certas regiões do mundo tão perto de sistemas democráticos, só foi possível através da lenta conquista do sentido da individualidade dos homens, de cada homem, processo que só teve inicio (esqueçamos Atenas) no fim da Idade Média. E a moda da Idade Média está aí, com cavaleiros, mágicos e feitos milagrosos ao dispor de todos os gostos e todas as mentes e todas as idades. Esta é a causa do tal mal-estar. E esta, a perda dos valores humanistas, é a principal causa das crises que nos afligem.
A partir do mal-estar assumido vieram as memórias e a exploração das memórias de pessoas, de factos ocorridos quando não tinha ainda distanciamento para lhes descobrir o sentido, de segredos mal guardados e de falsas verdades, de tudo o que via acontecer, perante o meu quase alheamento. E à medida que a escrita prosseguia o seu registo foi ganhando significado, tornando-se numa estrutura ficcional, que coincide e explica tudo o que se passa à nossa volta. Como é que vamos sair daqui sem ser matando-nos uns aos outros?
A dúvida mantém-se, mas já o livro estava acabado e entregue ao editor, por todo o mundo foram surgindo sinais e tentativas de encontrar os caminhos para

“O DIA CLARO”

2 comentários:

  1. Olá Julio
    Sou Herminia sua fã brasileira do( e desde) O Insecto Perfeito, lembra de mim? Que bom vc estar com um blog na internet. Agora poderá brindar seus leitores escrevendo um pouco sobre sua pessoa, sua vida e divulgando ainda melhor seus trabalhos (os já elaborados e os que ainda, com certeza, estão em andamento). Por falar nisso: Parabéns, pelo seu novo livro O Dia Claro. Breve o terei em mãos e o apreciarei como os demais outros por vc escritos. Quero aqui fazer uma sugestão: Quando mais jovem vc escrevia poesias. Há muitas pessoas que ainda gostam de poesia e sabem valorizá-la. Por que não coloca algumas delas em seu blog? Seria SUPER DEMAIS. Poesia é tudo de bom e seus admiradores iriam amar isso. Por hoje este é meu recado. A gente se encontra outra vez aqui neste espaço da internet. Muito carinho

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